Para a turma aproveitar ao máximo uma peça teatral, é importante iniciar em sala o trabalho de apreciação.
"A arte necessita de conhecimento. E a observação da arte só poderá levar a um prazer verdadeiro se houver uma arte da observação." Essa é uma das ideias defendidas pelo dramaturgo alemão Bertolt Brecht (1898-1956) que pode servir de inspiração para pensar em como fazer o trabalho em sala quando o assunto é linguagem teatral.
Apreciar, uma das competências básicas a ser desenvolvida na disciplina de Arte, não pode significar simplesmente levar a turma ao teatro (tal como olhar para um quadro, no caso das artes visuais, e escutar uma composição, no caso da música). Até os sinônimos atribuídos ao termo apreciação - julgamento, avaliação, juízo - apontam que se trata de algo mais reflexivo.
O foco do trabalho deve ser fazer as crianças desenvolverem um olhar e uma escuta atentos quando assistem a espetáculos. "Elas precisam perceber significados da obra em questão: o que há por trás dos gestos dos intérpretes, e dos outros elementos", diz Dirce de Carvalho, professora da Faculdade de Arte, Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) (leia a sequência didática).
Para que isso ocorra, a intervenção do professor é fundamental, o que não quer dizer que ele tenha de direcionar de maneira rígida o momento da fruição. "Os estudantes têm de ter espaço para construir percepções próprias a respeito do espetáculo e vivenciar a experiência com autonomia crítica. Apreciar não é sinônimo de gostar", diz Narciso Telles, professor do curso de Teatro e do Programa de pós-graduação em Arte da UFU. Em outras palavras, eles têm de construir ligações entre a manifestação artística e o repertório pessoal. E o papel do educador é fornecer elementos que provoquem questionamentos, inspirem reflexões e ampliem a visão da turma sobre o teatro em geral e a respeito da peça. Um trabalho que precisa ser feito antes de a trupe entrar em cena.
Apreciação e reflexão devem ser planejados juntos
Materiais informativos produzidos a respeito de peças teatrais, como críticas e resenhas, são recursos interessantes a explorar com o grupo para preparar o momento da fruição. Estudar com os alunos o tipo de peça que será prestigiado (drama ou comédia, por exemplo), onde ela será apresentada (no teatro de arena ou na rua) e o enredo é uma atitude muito importante para que todos tenham ideia do que presenciarão.
Na EMEF Prefeito Adhemar de Barros, na capital paulista, a professora de Arte Vera Parente tem o hábito de recolher imagens e textos sobre os espetáculos que as crianças do 1º, 2º e 4º ano vão assistir e apresentar tudo previamente para elas. O objetivo é fomentar um diálogo para que a turma fale sobre suas expectativas e faça perguntas a respeito do espetáculo. "Quando é chegada a hora, todos já estão aguçados e bem embasados para buscar significados nas entrelinhas da obra e também têm informações para embarcar na experiência, fazendo as próprias conexões de saberes."
Para ajudar os estudantes a aprender o que e como apreciar um espetáculo, é importante que todo professor seja um apreciador consciente e saiba que, quando se é espectador, não basta compreender a trama: são vários os elementos que merecem atenção. E, se possível, você deve sempre assistir à peça antes do grupo - não para adiantar informações, mas para checar se o produto tem qualidade e é adequado à faixa etária e também para poder contar sua experiência como apreciador, servindo como modelo. "A iluminação do espetáculo é bonita", "quando começa a tocar música, os atores convidam a plateia a cantar com eles" e "gostei da peça porque o último ato é surpreendente" são falas interessantes e que certamente deixarão as crianças instigadas. Quando não há a possibilidade de se adiantar ao grupo, vale a pena levantar com a turma dúvidas e expectativas sobre a apresentação.
Depois de assistir à peça, é normal que a criançada fique eufórica para falar sobre o espetáculo e esse é o momento de complementar o trabalho, encaminhando a turma para a reflexão. É importantíssimo ajudar os alunos a falar mais "gostei" ou "não gostei" e ir além das simples descrições. Todos concordam com as críticas que foram lidas antes de ir ao teatro? As imagens do cartaz da peça retratam bem o que foi visto no palco? Como eles recomendariam o espetáculo para os colegas de turma?
Perceba que, embora sejam momentos distintos, a apreciação e a reflexão devem estar associadas. "Um espectador que observa e aprecia se torna apto a fazer sua leitura crítica do espetáculo e amplia seu repertório para outras linguagens artísticas", explica Dirce.
Os erros mais comuns:
- Depois da peça, propor que os alunos respondam a questionários para avaliar a apreciação. É uma atitude reducionista, já que a apreciação é uma experiência individual. Melhor organizar uma roda de conversa para que todos exponham suas opiniões e compreendam que existem diversas maneiras de compreender a arte.
- Levar as crianças ao teatro ou a qualquer outra atração externa como se fosse um programa familiar. A escola tem de organizar passeios com objetivos didáticos e para isso é necessário planejar os objetivos e as atividades a serem desenvolvidas.