"A natureza é o único livro que oferece um conteúdo valioso em todas as suas folhas." (Johan Wolfgang Von Goethe)

terça-feira, 26 de março de 2013

Um mundo possível



Victor Hugo
Cidadãos, já imaginaram o futuro? As ruas das cidades inundadas de luz, ramos verdes à soleira das portas, as nações irmãs, os homens justos, os velhinhos abençoando crianças, o passado amando o presente, os pensadores em plena liberdade, os crentes em plena igualdade, o céu por religião, Deus Sacerdote direto, a consciência humana transformada em altar, não mais ódios, a fraternidade entre a escola e a oficina, por penalidade e por recompensa a notoriedade, trabalho para todos, paz para todos, direito para todos, não mais sangue derramado, não mais guerras, as mães felizes! Domar a matéria, eis o primeiro passo; realizar o ideal, eis o segundo…
E que revolução faremos? Acabo de dizê-lo: a revolução da Verdade. Do ponto de vista político, existe um único princípio: a soberania do homem sobre si mesmo. Essa soberania do eu sobre o eu chama-se Liberdade.
Mas nessa associação não há nenhuma abdicação. Cada soberania concede certa quantidade de si própria para formar o direito comum. Essa quantidade é idêntica para todos. Essa identidade de concessões que cada um faz a todos chama-se Igualdade. O direito comum não é nada mais que a proteção de todos brilhando sobre o direito de cada um. Essa proteção de todos sobre cada um chama-se Fraternidade. O ponto de intersecção de todas essas soberanias que se agregam chama-se Sociedade. Sendo essa intersecção uma junção, esse ponto é um nó. Daí o que chamamos de liame social. Alguns dizem contrato social, o que é a mesma coisa, já que a palavra contrato etimologicamente se forma com a ideia de liame. Entendamo-nos a respeito da igualdade, porque se a liberdade é o ápice, a igualdade é a base.
A igualdade, cidadãos, não é absolutamente toda a vegetação à mesma altura, uma sociedade de longas hastes de ervas e de carvalhos anões; uma aproximação de invejas cortando-as mutuamente; é, civilmente, as mesmas oportunidades para todas as aptidões; politicamente, todos os votos com idêntico peso; religiosamente, todas as consciências com os mesmos direitos. A igualdade tem um órgão: a instrução gratuita e obrigatória. O direito ao alfabeto; por aí é que devemos começar.
[Os Miseráveis – Cosac & Naify – 2002 - Tomo 2 - Quinta Parte – Livro Primeiro – Jean Valjean – página 545]

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