"A natureza é o único livro que oferece um conteúdo valioso em todas as suas folhas." (Johan Wolfgang Von Goethe)

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Bons tempos, aqueles!



Aquela velhinha de oitenta anos andava pelas ruas da cidade. Com o calor que fazia, resolveu parar e
descansar um pouco. Em frente ao "Fliperama do Osmar", ajeitou os óculos e leu: "Panorama Bar".
Entrou. Olhou a sua volta, lembrando-se dos seus tempos de mocinha, quando costumava freqüentar
lanchonetes, com as amigas para ouvir músicas naquelas máquinas acionadas a fichas – aquelas do tempo do
Cafunga!
Dirigiu-se ao rapaz do caixa e, com um rosto nostálgico, falou:
-Por favor, mocinho, uma ficha!
O rapaz, maquinalmente, entregou-a sem perceber que se tratava de uma simpática velhinha.
- Obrigada! – agradeceu ela.
Ao dar conta de si, o rapaz estranhou:
- Ei, vovó, a senhora sabe jogar?!
Ela virou-se para o rapaz e confirmou:
- Sim, um guaraná! Um guaraná!
Na máquina, ela depositou a ficha e esperou ouvir a música. Mas nada de ela tocar.
- Será que está com defeito? Já não se fazem mais vitrolas como antigamente! – falou relembrando o
passado.
Resolveu, então, discretamente, dar alguns cutucões para ver se funcionava. E nada de funcionar.
Reparou, porém, que algo de esquisito acontecia dentro da máquina e, curiosa, perguntou ao rapaz do caixa:
- Mocinho, que é que essa bolinha está fazendo aqui dentro?
- Ora, é assim mesmo – respondeu ele. – Aperte o botão, que funciona!
Ela apertou. Gastou todas as bolinhas e não quis repetir a dose.
- Essa juventude! – falou ao rapaz do caixa. – Antigamente não era assim!
- Como era, então? – indagou, interessado, o rapaz.
- Ah! Bons tempos, aqueles, que a gente colocava a ficha na vitrola e ela tocava sozinha, sem ficar
apertando aquele botãozinho.
Parou um instante de falar e ficou com os olhos perdidos no tempo. Começou a cantarolar uma
música de sua época, que fez seus olhos se encherem d’água. O rapaz não entendeu nada:
- Mas vovó...
Antes de ele completar, ela falou:
- Está tudo mudado, meu filho! Hoje, além de ficar apertando aquele botãozinho, as músicas não são
as mesmas. Hoje é só blim!blom!blim!blom! Isso que é o tal do rock, não é?
O rapaz tentou explicar:
- Não, vovó!| Aqui é uma casa para se jogar!
Ela pegou a ficha e falou:
- Não, não. Não quero mais o guaraná!
E saiu cantarolando a música que costumava ouvir nos seus tempos de mocinha.

Alexandre Azevedo. O vendedor de queijo e outras crônicas.São Paulo, 1991.

Nenhum comentário:

Postar um comentário